Essa semana tivemos a oportunidade de conversar com Evan Spiliotopoulos, produtor, diretor e roteirista de “Rogai por Nós”. Na entrevista, que você lê abaixo na íntegra, conversamos um pouco sobre suas principais inspirações no gênero do horror, principalmente o diretor italiano Mario Bava, bem como o que o motivou a trazer para as telas e para os tempos atuais a história de Shrine, livro de James Herbert publicado em 1983.
República do Medo: Antes de mais nada, olá sr. Spiliotopoulos, muito obrigado pelo seu tempo!
Evan Spiliotopoulos: O prazer é meu, obrigado. E, por favor, me chame de Evan!
RdM: Ok, muito obrigado! Nós somos um podcast e site brasileiro chamado República do Medo, especializado no gênero do horror, então eu agradeço demais por você ter tirado um tempo para conversar conosco hoje. Parabéns pelo filme!
Evan: O prazer é meu, obrigado pelo convite.
RdM: Evan, você escreveu, produziu e dirigiu “Rogai por Nós”. O que no livro de James Herbert [Shrine, 1983] te interessou tanto a transportar essa história para as telas?
Evan: Eu li o livro Shrine quando eu tinha 12 anos. Ele foi lançado em 1983 e eu acabei de entregar minha própria idade, mas aí está [risos]. E eu já era um fã de filmes de horror. Eu amo filmes que misturam gêneros e eu vi nesse livro uma combinação do thriller sobrenatural clássico, como “O Exorcista” (1973), com um ótimo thriller jornalístico. A comparação mais atual seria com “Spotlight: Segredos Revelados” (2015), então Spotlight encontra O Exorcista. E eu gosto de filmes que basicamente começam de um jeito e te levam para outra direção. Então, como você viu, “Rogai por Nós” começa com um jornalista corrupto que só quer voltar ao topo e então ele esbarra nestes milagres incríveis, reporta a história e sua carreira é devolvida a ele… e as coisas dão errado [risos]. E então o que eu realmente gostei foi ter esse personagem central que tem um ótimo arco de redenção e poder tornar tudo assustador ao longo do caminho.
RdM: Isso… isso é excelente! É o que você sente assistindo ao filme, de verdade. E você falou sobre o horror ser uma espécie de paixão sua quando você era mais jovem, certo? [Evan concorda] Então, que inspirações você tirou de outros filmes? Você já citou “O Exorcista”, mas você pode nos falar um pouco sobre filmes e diretores, mais envolvidos com o gênero do horror, que te inspiraram na produção de Rogai por Nós?
Evan: Com certeza! Há uma referência imediata: este filme é uma carta de amor a Mario Bava, o grande diretor italiano de horror dos anos 60 e 70. O filme abre com uma homenagem a “A Maldição do Demônio” (1960), inclusive. Mas, considerando que o nosso filme é em cores, o filme de Mario Bava que nós nos inspiramos visualmente é um filme chamado “O Chicote e o Corpo” (1963), com Christopher Lee, que é uma história com fantasmas, mas é um gótico moderno, por assim dizer. Mario Bava amava ter iluminação e efeitos de iluminação que não estavam no universo do filme. Então, basicamente, o herói estava andando em um corredor escuro e de repente havia uma luz verde cortando o corredor, e você nunca para e se pergunta “de onde aquela luz verde está vindo?”, ela simplesmente está lá, e é incrível! Então nós fizemos muito disso, como…. e sem entregar muito sobre “Rogai por Nós”, há um enforcamento no filme e quando a câmera está apontada para cima, o teto acima do personagem está iluminado quase como um afresco. Não há nada lá, é só um teto branco, mas a iluminação faz ele parecer quase uma pintura elaborada atrás do personagem. E nós queríamos um filme que fosse visualmente interessante dessa forma e não apenas escuridão pura, mas com várias combinações de cores e efeitos de iluminação para criar o senso de irrealidade.
RdM: Nossa, eu amei sua resposta, porque eu realmente pensei no Mario Bava assistindo ao filme, nós somos fãs dele. E eu só queria dizer que aquela sequência de abertura da morte de Mary com aquele enquadramento em primeira pessoa é simplesmente brilhante.
Evan: Fico feliz. Muito obrigado, muito obrigado.
RdM: A cena realmente estabelece o tom para o restante do filme. E falando um pouco sobre a história, eu notei que o livro de Herbert se passa em 1983, certo? [Evan acena], quando ele publicou a história. Então, você pode nos contar um pouco sobre qual foi a ideia por trás da decisão de contar essa história nos tempos atuais, não em 83, e fazer a internet e as redes sociais desempenharem um papel importante no desenvolvimento dos personagens e da história?
Evan: Com certeza! A ideia de transformá-lo em um filme contemporâneo em vez de adaptá-lo na época em que o livro foi escrito é que, bizarramente, no tempo que demorou para levar a história às telas, o tema tornou-se mais atual do que nunca. Ou seja, as palavras fake news, que são o coração deste filme, estão no Zeitgeist agora. Então, a ideia foi que…. o livro de James Herbert tinha relação principalmente com a mídia impressa. Fenn é um jornalista de uma revista, seus competidores – e há outros jornalistas no livro – são do New York Times. A televisão aparece apenas ao fim do grande clímax, quase como uma adição posterior. Por outro lado, na nossa era, a mídia impressa está morta. Eu ainda queria que o Fenn fosse um jornalista de meio impresso, porque eu queria um aceno ao clássico repórter de filmes em preto e branco dos anos 40 e 50. Mas, como você pode ver, câmeras e as mídias sociais entram na história quase imediatamente. E há uma explosão de interesse viral nas obras de Alice e nos milagres de Mary que eu senti que era bastante contemporânea. O que eu quero dizer é que qualquer um com uma câmera vira seu próprio jornalista nos tempos atuais e histórias podem explodir e atingir todos os cantos do globo através das mídias modernas, ao contrário dos tempos antigos. E para uma personagem como Mary, que quer atingir e corromper o maior número de pessoas possível, cara, o mundo moderno e a mídia moderna são maravilhosos pra ela, não são?
RdM: Sim, sim. Isso é muito interessante, porque geralmente esse tipo de filme se passa em épocas anteriores, mesmo quando são feitos hoje em dia, então é uma opção corajosa usar o que temos atualmente, especialmente as mídias sociais, para exponencializar a história, parabéns por isso.
Evan: Obrigado! E eu também adicionaria algo: você como um fã de horror vai reconhecer isso. Na maior parte das histórias de fantasmas, o fantasma não tem muito uma personalidade. Ou seja, o fantasma é quase um elemento da natureza, suas regras são muito simples. Em “O Grito” (2004), se você entra na minha casa eu te mato. A maior parte dos filmes de casas assombradas é “você está na minha casa, vá embora! Eu vou te matar!”. “Terror em Amityville” (1979) é assim, “Desafio do Além” (1963) é assim. Este fantasma [o de “Rogai por Nós”] tem um objetivo (‘agenda’). Este fantasma aparece e diz “caramba, esse é o século XXI?? Que brinquedos eu posso utilizar?”, o que eu realmente gostei.
RdM: [risos] Sim! Isso é ótimo. E estão me dizendo aqui que eu não tenho muito tempo, então, Evan, há alguma coisa que você gostaria de dizer para os fãs de horror no Brasil sobre o seu filme e o que vem a seguir?
Evan: Bem, a primeira coisa que eu gostaria de dizer é: por favor, fiquem seguros. Porque eu sei que são tempos amedrontadores para todos nós, mas… vocês estão em uma situação particularmente difícil, então por favor fiquem seguros. E, sabe, em tempos como esse… meu filme de horror foi feito para assustar as pessoas, mas ele foi pensado antes da pandemia. E tudo o que eu posso dizer agora é: ele é uma divertida fantasia escapista, porque a realidade é muito mais assustadora do que qualquer coisa que eu possa colocar lá.
RdM: Sim, especialmente no Brasil.
Evan: Sim, sim.
RdM: Mas, Evan, muitíssimo obrigado pelo seu tempo e por sua atenção, o filme é ótimo e eu te parabenizo pela direção, as referências ao Mario Bava me impressionaram muito… então parabéns de novo e obrigado pelo seu tempo!
Evan: Muito obrigado, muito obrigado.
“Rogai por Nós” (The Unholy) já está disponível para aluguel e compra nas plataformas de streaming. Confira o trailer oficial: https://www.youtube.com/watch?v=RPjdEYOytxw