Entrevista | Amanda Orlando

Autora do livro Predestinados

Editora: Globo Livros

2023

Misturando romance histórico com horror, Predestinados é o livro de estreia da autora brasileira Amanda Orlando. Publicada pela Globo Livros, a história se passa na Itália do século XVII e acompanha a influente família Manfredi. Extremamente prestigioso, o clã possui poder econômico e militar, sendo respeitado e temido pela nobreza e pelo próprio Vaticano. No entanto, esse poder vem de uma fonte sombria, um segredo trancado a sete chaves: desde a Antiguidade, os Manfredi são capazes de se comunicar com os mortos, fazendo com que, por meio de práticas e rituais, eles se curvem às suas vontades. Quando Luciano, filho mais novo do patriarca da família, cumpre uma velha profecia e se torna o mais talentoso Predestinado – nome dado aos que possuem o dom de interagir com os mortos – o destino da família fica ameaçado e muda para sempre.

Recheado de personagens fascinantes, paixões, ambições, intrigas familiares e jogos de poder, Predestinados é uma trama que vai tirar o fôlego dos amantes do horror e o República do Medo teve a oportunidade de conversar com sua autora, Amanda Orlando.

Confira a entrevista abaixo:

 

Você disse que Predestinados foi fruto de três anos de pesquisa e mais um ano e meio de escrita. Conta para a gente um pouco como foi esse processo.

AO: Comecei com os protagonistas, os Manfredi, criando as personalidades, as nuances de cada um e o papel que eles ocupavam na engrenagem daquela família. A única coisa que eu sabia era que queria que eles habitassem a versão da cidade de Parma, no norte da Itália, o lugar de onde vieram meus avós paternos – a única característica que tenho em comum com os Manfredi – da qual eu guardava uma memória afetiva que beirava o mítico por conta das histórias que cresci ouvindo, do dialeto, dos pratos e das lembranças com os quais cresci.  Durante esse processo, me dei conta de que o melhor período para dispor esses personagens era o final da Renascença, uma época de decadência, guerra, desbravamento de oceanos, Inquisição e muita permissividade na Europa em geral e na Itália em especial. Daí comecei as pesquisas sobre o período, não só da geopolítica, como os hábitos, os costumes, a sociedade, as vestimentas, as relações sociais, etc. Isso foi o que consumiu mais tempo. Com o “grosso” da pesquisa pronta e centenas de páginas de construção de personagens, compor o romance propriamente dito foi um processo relativamente rápido, já que eu já conhecia muito bem os meus protagonistas, o seu tempo e onde eles deveriam chegar. Claro que no meio do caminho tive que parar para fazer novas pesquisas diante de questões que a trama ia me impondo, mas nada comparado ao volume das pesquisas iniciais.

 

De onde veio seu interesse pelo horror?

Eu realmente não tenho uma resposta para essa pergunta. Desde que me entendo por gente era o meu gênero preferido para livros, filmes e o que quer que fosse. O halloween era a minha festa preferida e quando em perguntavam o que eu queria ser quando crescesse, eu respondia que queria ser uma vampira e cheguei a pedir um caixão de aniversário… hahaha. (Meu pai não me deu, claro, mas cortou uma caixa de geladeira ao meio, embalou em papel preto e cortou umas alças de papel-alumínio para que eu brincasse de vampiro… hahaha). Só sei que o meu interesse não pelo horror exatamente, mas pelo gótico e o mórbido me levaram a estudar Antropologia, me especializando em rituais de luto e, mais tarde, Literatura Vitoriana. 

 

Predestinados é uma mistura de romance histórico e narrativa de horror. Onde surgiu essa ideia de misturar os dois gêneros? Quais foram as dificuldades encontradas?

Como explicado na primeira pergunta, em um primeiro momento não pensei em Predestinados como um romance histórico, porém, enquanto construía os personagens, me dei conta de que o século XVII era o período ideal para que eles fossem gerados. De qualquer forma, história e o gótico sempre foram os meus dois temas preferidos, de forma que não me surpreendeu que Predestinados acabasse se tornando um romance de horror histórico.

 

Os personagens principais, da família Manfredi, são muito bem trabalhados e extremamente complexos. Existe alguma inspiração real por trás dessas caracterizações?

Não, nenhuma. Talvez o que passe mais perto, e mesmo assim apenas como uma inspiração geral, foram as grandes dinastias burguesas da Itália Renascentista, como os Bórgias, os Médici, os Orsini e os d’Este. Não por coincidência, as três últimas, que ainda estavam na ativa, são rapidamente mencionadas como personagens secundários em Predestinados.

 

Quais foram suas maiores inspirações para seguir a carreira de escritora?

Acho que não tive nenhuma grande inspiração propriamente dita, mas sem dúvida tudo que eu escrevo foi influenciado por alguns dos meus autores preferidos, que incluem nomes variados – e muitas vezes discrepantes – como Poe, Anne Rice, Ken Follett, Philippa Gregory, Donna Tartt, Chuck Palahniuk, Breat Easton Ellis e Thomas Mann.

 

Qual seu livro de horror preferido? E filme? 

A lista é longa, mas para não fazer um rol tedioso, fico, na literatura, com Contos de grotesco e arabesco, do Poe, e Frankenstein, da Mary Shelley, duas obras-primas seminais para tudo que viemos a conhecer mais tarde como horror. Já em relação a filmes, fico com O bebê de Rosemary, O iluminado, A profecia e, para não dizerem que estou old school demais, A colina escarlate, uma obra-prima do gótico, que reúne com maestria todos os elementos do gótico em um cenário incrível, com um figurino de tirar o fôlego e personagens ao mesmo tempo simples e com várias camadas. Gol de placa do Guillermo del Toro, não por acaso um dos meus diretores preferidos.

 

Você pode indicar aos nossos leitores outras obras do horror que considera essenciais?

Para ser bem sincera, não acredito em obras essenciais. Isso varia muito do gosto pessoal, da maturidade literária e do momento de cada leitor. Sou totalmente contra leituras obrigatórias (criei trauma desde a época da escola, pois, apesar de ser a criança que vivia com a cara enfiada nos livros, odiava todas as leituras que eram requisitadas pelos professores, que eram exatamente tudo que eu NÃO queria ler). O que eu posso falar é do que foi essencial na minha formação como leitora de horror, o que pode servir no máximo como uma indicação, mas jamais como um cânone. Eles vão desde a série “O pequeno vampiro”, da Angela Sommer-Bodenburg, meu primeiro contato com a literatura com elementos góticos quando eu era recém-alfabetizada e que me fez ter desde muito jovem a certeza do que queria escrever quando “crescesse”. Depois, “As crônicas vampirescas” e a série das Bruxas Mayfair, da Anne Rice; e em seguida todos os autores vitorianos pelos quais me apaixonei: Poe, Mary e Pierce Shelley, Byron, Ann Radcliffe, Matthew Gregory Lewis, Emily Brontë e por aí afora; até chegar a As coisas que perdermos no fogo, da Mariana Enríquez, Digam a satã que o recado foi entendido, do Daniel Pellizzari (que não é um livro de terror per se, mas é um dos romances mais assombrados e perturbadores que eu já li); Pornofantasma, do Santiago Nazarian, Gótico nordestino, do Cristhiano Aguiar… Graças aos deuses, sempre tem muita coisa nova e surpreendente chegando.

 

Predestinados já está à venda em livrarias físicas e online.

 

Créditos da foto: Tissiana Chaves