Crítica | Fale Comigo

Talk to Me

Direção: Danny e Michael Philippou

Ano: 2022

País: Austrália

Distribuição: Diamond Films

Nota do crítico:

Acho que uma sensação que une todos os que assistem filmes de horror é aquele sentimento compartilhado de saber que os personagens vão se ferrar pelo único fato de fazer aquilo que grita PERIGO e ESTUPIDEZ. Fale Comigo começa justamente com a gente gritando ‘NÃO FAZ ISSO’ para a protagonista.

No filme, Mia (Sophie Wilde), ainda em luto pela morte da mãe, vai com sua melhor amiga Jade (Alexandra Jensen) e seu irmão Riley (Joe Bird) para uma festa com um artefato que promete, a quem toca, o contato com espíritos de forma instantânea, imediata. O problema é que, se as regras não forem cumpridas, as consequências podem ser demoníacas. 

Antes de tudo, é bom lembrar que o filme australiano foi adquirido para distribuição norte americana pela A24, uma das queridinhas do terror nos últimos anos e que está ditando as regras do terror atual (ou resgatando algumas dessas regras e atualizando-as).

Isso significa que, apesar de cenas nojentas e perturbadoras – acredite, elas estão aqui –, não se prenda a expectativa de um filme repleto de jumpscares ou sem pelo menos duas interpretações além do explícito. Fale Comigo carrega uma grande carga psicológica por trás de seus espíritos e perigos.

Sophie Wilde tem um papel difícil de trazer empatia a uma Mia que não é um personagem tão fácil de gostar. Mia tem atitudes arrogantes, que gritam uma falta de respeito às regras, uma desobediência descabida, uma lealdade que não dá para confiar. Ao mesmo tempo ela é doce com Riley, ela é compassiva, ela é solitária. 

No final das contas, Mia é uma adolescente. E o que é um adolescente senão alguém que não é inocente o suficiente para ser uma criança enquanto também não tem a noção e a compreensão das responsabilidades que tem um adulto?

Para a maior parte das pessoas parece meio óbvio que segurar numa mão de gesso que torna possível ver espíritos não seja a melhor das ideias. Mas, às vezes, as consequências não são tão importantes (ou passíveis de consideração) quanto à jornada. 

Outro personagem importante para a trama é o Riley. Ele, de certa forma, tem em si aquele papel de mostrar que você às vezes não precisa seguir a modinha do momento. Está tudo bem ser você, e, ao se render, o coitado sofre mais do que a Juliette. 

Além da condição de ser um coming-of-age de terror, Fale Comigo também tem uma óbvia referência ao uso de drogas. A forma que os diretores mostram as sessões nas festas poderiam ser trocadas por eles usando álcool ou algo ilícito e teria sentido igual. O filme deixa clara a mensagem de: crianças, não se metam com tóxico. 

Relativo aos aspectos técnicos, o filme tem uma direção muito interessante. A dupla não foge muito do tradicional mas vão desenvolvendo ótimos momentos à medida que o sobrenatural vai sufocando Mia. 

O roteiro, apesar de certas derrapadas, consegue fazer ligações interessantes entre diferentes momentos, tudo em busca de evoluir Mia como personagem e nos deixar ainda mais ligados em seus pensamentos e desejos.

Minha experiência com o filme, porém, pode ter sido prejudicada pelas minhas altas expectativas. O filme parece que tem algo faltando por boa parte do tempo, algum tempero que daria a Fale Comigo um tom um pouco mais épico. 

O que, pra ser sincero, não parece ser o objetivo do filme. Fale Comigo não parece pretender ser épico. Ele não pretende tornar a experiência de Mia algo tão fora da curva pois, no final, “qualquer um pode passar por isso”. É a forma crua que as situações se desenrolam e a falta de misericórdia dos acontecimentos que tornam a jornada de amadurecimento tão real. E que jornada…