TAU
Data de Estreia no Brasil: 29/06/2018
Direção: Federico D’Alessandro
Distribuição: Netflix
Misturar terror e sci-fi em um filme não é de forma alguma uma ideia recente. Já aquela que é muitas vezes considerada como a primeira obra de ficção-científica de todos os tempos, “Frankenstein”, havia sido pensada e por fim escrita como um conto de horror. De lá para cá, há inúmeros exemplos de filmes que se utilizam do elemento sci-fi para explorar o medo do desconhecido, como em “Alien”, ou o medo de sermos substituídos por algo mais inteligente e mais avançado, como em “O Exterminador do Futuro” ou “Aniquilação”. Portanto, o novo filme da Netflix, “TAU”, propõe explorar uma interseção entre dois gêneros que já foi bastante abordada por várias obras cinematográficas ao longo do século XX, com maior ou menor sucesso. Na mais recente destas misturas, que abordarei aqui, as boas intenções da equipe criativa acabam um pouco sobrepujadas por sua própria limitação narrativa, colocando “TAU” em um meio termo entre os bem e mal-sucedidos filmes de horror/sci-fi.
A premissa do roteiro escrito por Noga Landau é ao mesmo tempo bastante simples e promissora. Com um primeiro ato bastante rápido e que evita exposições desnecessárias, conhecemos a protagonista Julia (Maika Monroe), uma mulher que realiza furtos em baladas e revende seus “espólios” para uma penhora. Este início tem uma montagem bastante ágil e competente (apesar de seu único diálogo ser um clichê preguiçoso) e apenas estabelece Julia como uma pessoa sozinha, que ninguém se preocupará em procurar quando ela é sequestrada pelo bilionário Alex. Uma espécie de Steve Jobs “do mal” (ou seja, Steve Jobs rsrs), Alex é pressionado por seus acionistas para apresentar o protótipo de uma Inteligência Artificial auto-suficiente, que tenha a mesma capacidade de aprendizado de um ser humano. Assim, o empresário prende Julia dentro da sua casa protegida por uma IA super inteligente e onipresente, para que ela realize testes que o ajudarão a atingir o protótipo perfeito de uma IA responsiva e auto-suficiente.
A primeira meia hora de “TAU” é praticamente um horror do tipo “slasher”, pois a IA que controla a casa de Alex tem sua representação física em uma espécie de AT-AT, responsável pela segurança da casa e por garantir que Julia permaneça presa. Em seu segundo ato, no entanto, “TAU” vai progressivamente ganhando mais elementos de um sci-fi clássico, construindo uma relação de proximidade entre Julia e a IA, TAU. Há aqui interessantes elementos de descobrimento de consciência e anseio por liberdade, com Julia funcionando como uma espécie de tutora e reveladora para TAU, que se vê dividido entre a protagonista e seu criador, Alex. Esta dicotomia um tanto simplista entre o lado “bom” e “mau” da natureza humana e a ingenuidade pueril de TAU no meio é “suavizada” pela excelente atuação de Gary Oldman, capaz de conferir à IA um tom preciso de frieza inumana que aos poucos é transformada em excitação e raiva juvenis, tornando palpáveis seus sentimos e sua própria existência.
É uma pena, portanto, que os personagens humanos não sejam tão interessantes quanto TAU. O Alex de Ed Skrein é completamente unidimensional e se limita a uma psicopatia inexpressiva que em nada lembra a egomania complexa de Oscar Isaac em “Ex Machina”, filme que “TAU” claramente busca emular. Já Maika Monroe, apesar de melhor atriz que Skrein, não consegue superar a barreira do pouco desenvolvimento narrativo e dos diálogos clichês que o filme lhe fornece, sendo uma protagonista que evoca nossa simpatia apenas por sua situação na trama, não por seu carisma. Fica faltando, portanto, maior complexidade ao roteiro de Landau, que estabelece uma premissa com bastantes furos narrativos, e busca discutir a existência humana a partir da simples contraposição com uma vida artificial, sem conferir complexidade a essa humanidade em primeiro lugar.
“TAU”, assim, acaba dividido entre dois gêneros e incapaz de explorar o potencial máximo fornecido por ambos. Há um desequilíbrio bastante grande entre o segundo ato, que se dedica ao desenvolvimento de um conflito mais clássico do sci-fi entre humanidade/artificialidade, e o primeiro e terceiro atos, que representam a tentativa de fuga de uma protagonista de uma situação de cativeiro. Faltou ao roteiro uma maior sofisticação narrativa na hora de conduzir a estrutura básica do thriller, que é o que nos deve prender à trama, e que acaba um pouco clichê e formulaico. Apesar disso, a boa condução técnica e imagética do também novato diretor Federico D’Alessandro, que carrega muito bem as cenas de “ação”, contribuem para criar uma trama bastante engajante apesar de suas falhas, com alguns esparsos, mas belos, momentos de brilhantismo. Por fim, um CGI que acerta em cheio na composição de TAU, mas parece simplesmente falso no restante, completa o quadro de um filme que, apesar de competente e nunca entendiante em seus 97 minutos, tentou lidar com questões e perguntas muito mais complexas do que deveria, em detrimento do que poderia ser uma trama mais simples e, assim, melhor executada. Com esta premissa, “TAU” deveria ter pendido mais ao horror do que ao sci-fi.