(The Lodge)
Data de Lançamento: 07/02/2020
Direção: Veronika Franz e Severin Fiala
Distribuição: Neon
Nos sentirmos satisfeitos e realizados ao assistir um filme de horror inventivo, que fuja das previsíveis e rasas convenções do gênero, é algo cada vez mais raro de acontecer. O terror ao longo das décadas se tornou algo extremamente comercial/popular, e muitas de suas técnicas de direção e estratégias de roteiro inevitavelmente não demoraram para se tornarem ultrapassadas. Para o alívio dos fãs do gênero, em média de três a cinco vezes por ano, ainda surgem filmes que não se rendem às terríveis fórmulas prontas de jump scares baratos, personagens ignorantes e narrativas improváveis. É com felicidade que podemos (e devemos) afirmar que The Lodge, ainda que com todas suas imperfeições, é um desses filmes.
Pouco tempo depois de um evento traumático, Richard (Richard Armitage) resolve levar seus dois filhos, Aidan (Jaden Martell, de It) e Mia (Lia McHugh), para uma viagem familiar numa distante cabana de inverno, com o intuito de os apresentar sua recém-noiva Grace (Riley Keough), que parece esconder um passado conturbado. Quando Richard recebe uma ligação e precisa voltar para a cidade a trabalho urgentemente, deixa seus filhos nos cuidados de Grace, temporariamente. É enquanto a tensão entre madrasta e enteados cresce que acontecimentos assustadores e inexplicáveis começam a acontecer.
Por meio de uma introdução forte e uma motivação convincente dos personagens, nos vemos imersos dentro da trama dentro de minutos. Os diretores e roteiristas Veronika Franz e Severin Fiala, responsáveis pelo ótimo “Boa Noite Mamãe” (2014), são rápidos em nos fisgar com uma condução cativante de suspense e drama. De cara já é impossível não notar diversas semelhanças com o filme “Hereditário” (2018), desde elementos visuais e composição de iluminação/fotografia das cenas, até a própria estrutura do roteiro e o ritmo do enredo. Mas felizmente essas inspirações apenas agregam, e não afetam a originalidade e a identidade própria de The Lodge.
Após estabelecer o conflito, o protagonismo do filme é assumido de vez por Grace. A narrativa a desenvolve de forma multidimensional e realista, com qualidades e defeitos, um exemplo disso são as cenas em que a madrasta demonstra tentar se aproximar dos enteados, mas também não esconde seus traços de insatisfação diante da situação. Todas as nuances e sentimentos da personagem são refletidas nas dúvidas do próprio espectador, ao passo que a narrativa se elabora na linha tênue entre o terror sobrenatural e o psicológico. A atriz Riley Keough (neta de Elvis Presley), entrega uma interpretação consistente e impecável, se equilibrando entre a necessidade de estar presente para os filhos de seu noivo e a dificuldade de lidar com suas alucinações e os acontecimentos bizarros da casa.
The Lodge não é isento de deslizes. Além de algumas decisões improváveis de personagens, principalmente de Richard, a obra encontra dificuldades em manter a atenção do espectador durante a metade de seu segundo ato, onde em vez de manter seu ritmo crescente, opta por atrasar os acontecimentos com um desenvolvimento demasiado lento em cenas que nem sequer se fazem necessárias. Porém, o filme logo recupera sua atmosfera sufocante antes mesmo do início de seu terceiro ato, e nos presenteia com uma conclusão extremamente audaciosa e compensadora.
Conhecendo bem o terreno fértil em que pisa, a direção e o roteiro arrasta o espectador pelos cômodos de uma casa aterrorizante, e gerando inúmeras dúvidas, nos faz tentar antecipar frequentemente o que de fato está acontecendo. Trazendo o melhor que o horror atmosférico pode oferecer, sugerindo e chocando seu público na hora certa e sem pecar por exageros, The Lodge, mesmo imperfeito, alcança um feito que poucos filmes de terror dos últimos anos conseguiram. A obra prova mais uma vez aos fãs de horror, que é muito mais interessante e efetivo aguçar a imaginação do espectador gradativamente, que escancarar rostos demoníacos e nos fazer pular da cadeira a todo tempo.