Vida

Vida
(Life)
Data de Estreia no Brasil: 20/04/2017
Direção: Daniel Epinosa
Distribuição: Columbia Pictures

         Antes da estreia de “Vida”, surgiu um rumor na imprensa americana de que o filme teria sido planejado pela Sony como uma prequel para “Venom”, que tem data de estreia marcada para o ano que vem. Independente da veracidade ou falsidade do boato, ele serviu para aumentar a publicidade gerada em torno do filme e fornecer de maneira simples um vislumbre sobre sua trama. Assim como o alienígena de matéria preta que assola o aracnídeo da marvel, o antagonista de “Vida” é uma forma de vida desconhecida metamórfica, encontrada no solo de Marte e trazida para a Estação Espacial Internacional. Não é nenhum spoiler dizer que a situação logo se deteriora e a forma de vida alienígena se volta contra os 6 astronautas habitando a estação, criando uma situação de sobrevivência que mistura elementos clássicos do sci-fi e do terror.

            O começo de “Vida” funciona como uma interessante introdução ao contexto da Estação e dos personagens. Passando pela clichê utilização da gravação de um diário de bordo para disfarçar a presença de diálogos expositivos, o filme de Daniel Espinosa emprega um inteligente trabalho de câmera para transitar pela nave e rapidamente apresentar as principais características de seus personagens e sua situação atual. O impressionante é a capacidade do filme de gerar tensão mesmo antes do aparecimento de seu título, aproveitando a ideia de que os astronautas precisam “resgatar” a cápsula enviada de Marte que sofreu um leve desvio em sua trajetória. A boa abertura serve para injetar tensão ao filme logo em seus momentos iniciais, conseguindo gerar uma ansiedade sobre o que virá a seguir.

            “Vida” definitivamente não é um filme movido por seus personagens. Seu desenvolvimento é apenas funcional (tirando um ou outro bom momento) e cumpre bem sua função de estabelecer características e elementos de personalidade que serão utilizados mais a frente. O efeito colateral dessa economia, no entanto, é a previsibilidade do destino dos personagens, tornando bastante fácil adivinhar o que o filme irá exigir de seus personagens durante o clímax. Não quero dar nenhum spoiler, mas preste atenção nisso e você certamente perceberá ao que me refiro. Por outro lado, as atuações são todas muito boas, apesar de os diálogos não possibilitarem nenhum grande destaque nesse quesito. Ryan Reynolds está ótimo em sua interpretação de Ryan Reynolds. Já Hiroyuki Sanada e Airyon Bakare conseguem gerar empatia em personagens bastante secundários. Rebecca Ferguson e Jake Gyllenhaal, por sua vez, assumem os papéis de maior destaque e estabelecem personagens críveis e com algum valor dramático.

               Um grande destaque de “Vida” está em suas excelentes composições visuais. Além do já citado bom trabalho de câmera por parte de Espinosa, os efeitos visuais do filme são impressionantes para um projeto que custou “apenas” 58 milhões de dólares. Todas as tomadas exteriores (que são poucas, justamente presando pela economia de recursos) são feitas com grande esmero, criando um cenário muito crível para a ação. Além disso, o ambiente da nave é muito bem construído pelo design de produção e a movimentação dos personagens em baixa gravidade é verossímil. No entanto, não há dúvidas de que o verdadeiro ponto a ser elogiado aqui é a representação do alienígena, que merece um parágrafo à parte.

            Desde o começo, a existência de uma vida extraterrestre é muito bem trabalhada pelo filme. O impacto da descoberta é demonstrado de forma verossímil tanto pelos astronautas na estação quanto pelas pessoas que assistem os eventos de longe, algo explorado em algumas breves cenas. O “despertar” do ser nomeado como Calvin é um pouco conveniente demais, mas sua movimentação e atitude são muito fluidas e constituem um verdadeiro espetáculo a parte. O aspecto de “plasma” líquido conformado em uma forma corpórea do alien gera uma interessantíssima representação visual, em um ser que impõe o medo através de sua movimentação extremamente ágil. Sua maleabilidade e capacidade de adaptação aos ambientes é justamente sua maior vantagem sobre os humanos e seu aspecto mais amedrontador.

           Para os fãs do terror, certos momentos de “Vida” serão um deleite absoluto. A sensação de “isso vai dar m%#$@” se estabelece logo nas primeiras cenas do filme, fazendo com que toda a interação entre humanos e alienígena seja tensa, mesmo que nenhum indício de perigo seja demonstrado. Quando a situação começa a realmente ficar hostil, a tensão que havíamos acumulado desde o começo do filme é extravasada em cenas extremamente violentas e genuinamente assustadoras. O filme consegue constituir um antagonista aterrorizador em sua simplicidade de movimentos, gerando tensão justamente quando não conseguimos vê-lo em tela. Devo admitir que algumas cenas de “Vida” me causaram uma tensão que fazia tempo que eu não sentia dentro de uma sala de cinema.

            A partir da metade de seu tempo de projeção, “Vida” acaba dando algumas escorregadas. Há uma barriguinha de uns 15 minutos no segundo ato e mais para o fim uma tentativa mal-sucedida de conferir um peso dramático que os personagens simplesmente não dão conta de concretizar. O filme poderia ter economizado tempo nessas duas partes e apostado mais em uma ação desenfreada, fornecendo uma maior constância com relação ao restante do roteiro. Há também uma “humanização” dos traços do alien mais para o fim que simplesmente não condiz com o conceito visual criado anteriormente e parece forçado. Independente disso, o antagonista criado aqui é formidável o suficiente para sustentar grandes momentos de tensão que constituem um filme que sabe utilizar bem os melhores elementos da combinação sci-fi + terror. Em suma, “Vida” pode até ser formulaico e não muito mais do que uma cópia de “Alien” (1979), mas é uma muito bem feita.