Bruxa de Blair

Lançado em 1999, “A Bruxa de Blair” foi um enorme sucesso de bilheteria, contando com um marketing espetacular (abordado com detalhes em um dos nossos podcasts) que conseguiu convencer as pessoas de que o que elas estavam vendo era literalmente um “Found footage” (filmagens achadas) de três jovens que se perderam no meio de uma floresta enquanto investigavam a lenda urbana da cidade de Burkesville: A Bruxa de Blair. Embora fosse um longa que conseguia criar tensão de quase nenhum elemento visível e que era enormemente saudado por uma abordagem dinâmica e barata de uma ideia bem simples, o longa também possuía diversos defeitos por estar preso a uma constante câmera na mão (crítica comum ao found footage), que limitava a imaginação e montagem criativa do projeto, ou mesmo o seu desfecho que soa um tanto anticlimático após uma construção de ansiedade fenomenal em seu ato final.

Eis que em pleno 2016 os produtores deste novo longa resolvem voltar a todos os temas e idéias que abordaram na obra original, trazendo desta vez uma técnica, mais refinada pelo desenvolvimento do Found Footage no terror nos últimos anos, que conta com a nova tecnologia (com o respaldo de um orçamento mais polpudo) para que o filme possa se desenvolver melhor. Assim, neste novo filme acompanhamos a mesma premissa que do longa anterior: Peter, Lisa, Ashley e James adentram a floresta de Black Hills para tentar desvendar pistas relativas ao desaparecimento da irmã deste último (Heather, a garota líder do grupo no primeiro filme), porém desta vez o falso documentário conta com a aquisição de um drone, uma câmera de vídeo de mão, uma web cam e pequenas câmeras que cada integrante do grupo ganha, ajudando sempre a dar mais dinâmica nos percalços passados pelos jovens.

A verdade é que, com tantos aparelhos de gravação, a montagem do filme (feita por Louis Cioffi) é um elemento que brilha por conseguir apresentar sempre o ponto de vista de cada personagem sem que com isso soe ilógico ou meramente confuso. Assim, se partimos da visão de um personagem que vê outros três um do lado do outro, quando a câmera passa pra perspectiva de um outro personagem nós sabemos exatamente quem este é pelo fato de o filme ter nos apresentado no enquadramento anterior a disposição em cena de cada integrante do grupo. Assim, se em um momento alguém vai buscar lenha, outros montam barracas, enquanto Lisa filma mais de longe (ela está montando um documentário sobre o desaparecimento de Heather), sempre podemos ter um vislumbre das ações dos personagens a partir de montagens paralelas que contribuem para o desenvolvimento da tensão e fluidez da narrativa.

Além disso, a adesão do tal drone ao filme, embora dispensável para a história, é um recurso técnico interessante para que os realizadores possam utilizar de planos mais abertos não muito característicos do subgênero no qual o longa se insere, contando ainda com uma diferenciação tecnológica interessante entre a qualidade de resolução das câmeras do grupo “protagonista” em contraste com a usado pelo casal que ajuda os jovens em seu caminho pela floresta, um detalhe que trás mais realismo a projeção. Ainda, a mixagem de som é extremamente importante para o filme que conta muito com os famosos jump scares para aterrorizar a platéia no miolo da projeção, utilizando-se deste com muita competência por saber como implementar o silêncio – ainda combinado com sons diegéticos da floresta – para que os sustos realmente funcionem.

Porém, se “Bruxa de Blair” funciona muito bem em seus aspectos técnicos, seu roteiro (escrito por Simon Barrett) acaba entregando-se como esquemático, funcionando ainda como um remake/continuação do filme original. Há alguns casos recentes de um grande acerto nessa perspectiva, como “O Despertar da Força” e “Creed”, filmes que davam uma nova roupagem para temas já abordados pelos longas anteriores em suas franquias, porém “Bruxa de Blair” incorre no erro de fazer isso sem fazer com que o espectador se importe com o destino dos personagens já que estes possuem motivações fraquíssimas (quando possuem), com a constante afirmação de James de que acreditava poder encontrar sua irmã na floresta depois de tantos anos soando sempre como uma mera muleta de roteiro que está ali muito mais para justificar a resolução pensada pelos criadores para o final do filme do que um meio de desenvolvimento e complexificação. Aliás, este é um problema recorrente na narrativa, já que todos os personagens são meras figuras decorativas para que nós possamos nos assustar, sem que eles tenham uma caracterização que vá além da mera criação básica de suas personalidades.

Porém, quando o longa chega a seu clímax não há como negar que este funciona muito bem ao criar uma atmosfera de tensão e ansiedade, corroborada ainda por uma claustrofobia tremenda da mata fechada da floresta. Aqui o filme consegue superar o longa de 99 ao trazer uma resolução muito mais eficiente para os eventos, dando a plena certeza de que o filme acabou na hora certa. Ainda, para chegar a tais sentimentos no terceiro ato, o diretor Adam Wingard e os membros de sua produção conseguem trazer nos dois primeiros atos um elemento de dúvida quanto aos acontecimentos que não só deixam o espectador inquieto, como também é muito bem vindo já que o sucesso do primeiro longa se deu justamente por conseguir enganar as pessoas de que tudo aquilo era real. Este é mais um elemento que faz com que este novo filme de 2016 nos lembre muito o de 1999, superando este em alguns aspectos básicos que os últimos 17 anos de found footage no terror permitiram desenvolver.