Crítica | A Garota do Terceiro Andar

A Garota do Terceiro Andar
(Girl On The Third Floor)
Data de Lançamento: 25/10/2019 (EUA)
Direção: Travis Stevens
Distribuição: Dark Sky Films

Felizmente foi-se o tempo em que bastavam referências de filmes cultuados, clichês reutilizados e muito gore para que um filme de horror caísse no gosto do grande público. Cada vez mais percebemos que, por mais importante que o conteúdo audiovisual seja para uma obra, nada se aproxima da relevância de um bom roteiro, que nos prende a atenção e brinca com nossas emoções de forma eficiente , e isso serve para qualquer gênero cinematográfico. No horror, costumamos adorar ver personagens banhados em sangue, aparências monstruosas e até protagonistas fugindo de espíritos e outras entidades ameaçadoras. Embora divertidas, nenhuma dessas características são o suficiente para que o independente A Garota do Terceiro Andar se torne realmente memorável aos olhos do espectador. 

A história gira em torno do ex-presidiário Don Koch (interpretado pelo lutador CM Punk, em sua primeira interpretação em um longa sem relação com os ringues), que tenta recomeçar a vida com sua esposa grávida, Liz (Trieste Kelly Dunn), e seu cachorro. Após comprarem uma mansão em condições precárias, Don se propõe a reformá-la. É quando, distante de sua esposa, começa a se relacionar com uma misteriosa e sensual jovem da vizinhança, chamada Sarah (Sarah Brooks), que o visita diariamente. Enquanto isso, acontecimentos estranhos dão a entender que a casa esconde um passado sórdido e macabro.

Traçando um terror calcado no gradativo suspense que ronda os corredores da mansão, a obra demora para se tornar o horror visual chocante pelo qual é conhecida. Após ficar evidente para o espectador que, na verdade, a casa já foi um prostíbulo há muitos anos (não é um spoiler), finalmente relacionamos o fato com o ambiente asqueroso e repulsivo no qual  Don pretende construir uma vida. Enquanto eventos misteriosos acontecem pela casa, esperma e outros líquidos nojentos vazam por buracos de tomada, intercalando cenas de viés cômico, usadas para demonstrar a adaptação do protagonista à sua futura moradia.

Porém, toda essa ambientação bizarra e inegavelmente original é elaborada, na maior parte do tempo, em prol de um vazio temático que dá lugar a uma trama moralista com enfoque no adultério cometido por Don, que só é explorado de maneira superficial pelo roteiro. A narrativa nos afasta de um possível horror e até de um reconhecimento dramático de tudo que presenciamos até o momento, pois, afinal, não nos identificamos nem de longe com o personagem principal e suas intenções.

Após uma evidente despreocupação do enredo com seus poucos personagens e a história que os envolve, o terceiro ato se aproxima do que podemos chamar de “compensação” aos espectadores que aguardaram até ali. É aí que a obra se assume de vez um terror gráfico, com pitadas de um body horror, e o sangue escorre com gosto. Durante uma ousada mas pouco funcional mudança de protagonismo, a mansão escancara sua verdadeira face àqueles que ali habitam, enquanto critica de forma direta as consequências da misoginia existente em nossa sociedade e, principalmente, em casas de prostituição. 

A Garota do Terceiro Andar conquista nossa atenção por suas referências visuais setentistas e seu gore em cenas criativas. No entanto, mesmo tentando desenvolver seus apontamentos de cunho social, não nos convence na maior parte do tempo. Provando-nos que CM Punk consegue ser mais expressivo que outros colegas de ringue que ainda tentam se aventurar em papéis para a telona, a produção em muitos momentos testa a paciência de seu público antes de realmente tornar-se interessante. De qualquer modo, não consegue justificar seu longo tempo de duração investido em sequências de tensão sexual e um humor que mal se relaciona com quaisquer mensagens que tenta transmitir, se é que as mesmas existem.