Crítica | Amuleto

Amuleto
(Amulet)
Data de Lançamento: 06/08/2020
Direção: Romola Garai
Distribuição: Magnet Releasing

 

Existem tantos elementos neste filme que são partilhados por Relic (2020) dirigido por Natalie Erika James, seja na sua base ou na forma como explora personagens em torno de um grande mistério e em torno dos efeitos especiais que podemos afirmar, se você gosta de um terror autoral e interpretativo, vai assistir a um filme semelhante.

Apesar de ser um filme que oferece grandes promessas, acaba entregando menos que o esperado. A história até tenta se desvincular ao padrão tradicional do gênero ao propor várias frentes como: discussão sobre xenofobia, traumas de guerra e filosofia de vida.

No filme acompanhamos o personagem Tomaz (Alec Secãreanu) que é um refugiado de guerra tentando nova vida em Londres, por conta de um determinado evento ele é acolhido por uma freira chamada Irmã Claire (Imelda Staunton) e vivem em uma casa, junto com a imigrante Magda (Carla Juri) e a mãe dela, que já está muito doente.

Do ponto de vista técnico, existe a tentativa da diretora de trabalhar muito com a paleta de cores com o objetivo de vincular o passado do protagonista Tomaz, junto com sua nova vida em Londres e o mistério que o filme propõe. O filme apresenta flashbacks do período de guerra no país natal de Tomaz a apresentação da língua falada naquele país como um elemento secundário, que acaba atrapalhando diretamente na resolução do filme.

Aos poucos a diretora começa a oferecer muitas informações o que acaba deixando um grande número de questões em aberto. Uma delas inclusive em torno do próprio amuleto, referenciado no título do filme.

Notadamente o filme é um projeto B por essência, é visível o baixo orçamento aplicado, o que nos leva a imaginar sobre os problemas que a produção teve para conseguir orçamento. Isso interfere na direção de arte e acaba afetando também diretamente na atuação.

A diretora tentou superar as dificuldades com saídas criativas, lamentamos por ela não ter seguido com essa decisão durante todo o filme. O potencial de Romola Garai é indiscutível, o próprio filme por conta desses experimentos é uma prova disso. Já o roteiro, que também foi assinado por ela, não reflete a genialidade da direção, todas as decisões inseridas nele para sustentar a trama, o mistério e o terror no filme, especialmente nos 30 minutos finais, são incoerentes.

Como é um filme menor, entendemos que ele necessita da inserção de um ou outro clichê para conseguir se destacar e conseguir um projeto de distribuição, já que é sabido que um investimento direto em um terror autoral é quase nulo no cenário atual.

Digno de nota é a atual necessidade de que as produções menores precisam de um plot twist sustentado em efeitos especiais, em tempos anteriores no terror independente, imperava a arte da surpresa, a criatividade para superar a falta de orçamento o que hoje em dia se ancora em efeitos de CGI. Amuleto toma esse rumo, e mesmo sabendo da dedicação e trabalho realizados para a produção daqueles efeitos, para um filme de 2020, os efeitos especiais foram muito insuficientes.

A diretora até tenta diminuir a iluminação em cenas em que os efeitos especiais são utilizados, para que não se dê destaque a eles, já que deixam a desejar. O que começou com uma distração, acabou comprometendo o filme, uma vez que a decisão de apostar tudo nos efeitos especiais para o desfecho da trama, leva a uma queda abrupta na qualidade e na própria história.

É um filme que possui um conteúdo extra, ele fala sobre preconceito e sobre quebrar estereótipos. Em determinado momento o personagem Tomaz foge completamente daquele tipo de refugiado que acaba sendo aproveitado nos cinemas, tanto é, que seu objetivo na trama é concluir seu doutorado em filosofia, mas em determinado momento do filme ele se mostra brilhante e em outros toma as piores decisões possíveis. É praticamente impossível não notar essa falta de equilíbrio. O vínculo proposto entre o presente e o passado é pensado de uma forma técnica, existe um trabalho de luminosidade especial em torno dele, mas não faz muito sentido. Existem breves despejos emocionais na relação do Tomaz, com duas mulheres diferentes na sua vida que também não nos convence.

Por outro lado, Amuleto tem outras camadas, sua estrutura nos lembra muito Dario Argento em Suspiria (1977), o que nos faz pensar que o filme realmente assuma sua participação no subgênero focado em bruxas. Essa semelhança está longe de ser classificada como plágio. O filme, nesse quesito, é um belo resgate do horror clássico transmutado em uma linguagem contemporânea.

Ainda além, a diretora arriscou na criação de uma mitologia original, trazendo uma personagem com potência para uma franquia ao nível do clássico de Clive Barker, Hellraiser. A apresentação de diversos ícones em vários formatos tais como: a entidade, o amuleto e a concha aparecem em diversos formatos durante o filme.

Pode ser que o espectador atual não seja tão aberto a reverências feitas a filmes clássicos do terror, quanto os entusiastas do gênero, muito pelo fato de estarem condicionados a filmes de terror paranormal que prometam pesadelos por uma semana. Amuleto, infelizmente, não conseguiu se apresentar como autoral suficiente para entrar na lista de filmes recentemente produzidos por Ari Aster ou Robert Eggers, provavelmente passará desapercebido e dificilmente receberá algum reconhecimento.