Crítica | Carro Rei

Carro Rei
Direção: Renata Pinheiro
Data de Lançamento: 09/09/2021
Cinefantasy 12

O filme de Renata Pinheiro foi o vencedor da edição de 2021 do festival Cinefantasy. Na trama, Ninho é um rapaz que possui a estranha habilidade de se comunicar com carros. Sua vida inteira foi marcada por isso desde o início – ele nasceu dentro de um fiat uno, parte da frota de seu pai, taxista. Apesar do aparente destino traçado, o garoto escolhe cursar Agronomia, contrariando as vontades do pai.

Trabalhando com a temática do transhumanismo, Carro Rei (2021) fala sobre a adesão a uma ideologia. Zé Macaco (Matheus Nachtergaele), adora criar e experimentar em seu ferro-velho. Após uma lei que proíbe com que carros com mais de 15 anos de idade circulem, ele turbina o antigo fiat uno da frota de taxis, transformando-o no Carro Rei. Sua voz que antes somente era escutada por Ninho, agora pode ser ouvida por todos.

O Carro Rei possui grandes pretensões. Ele convence outras pessoas e outros carros a se unirem a ele em busca de uma sociedade de predominância automobilística. Os carros que não aceitam são forçados a se unirem ou então sofrem violência. Enquanto isso Ninho se vê em meio a dilemas. A ideologia de Carro Rei é compatível com aquilo que ele acredita? É possível atender aos pedidos da máquina e seguir com os planos traçados anteriormente?

Renata Pinheiro conduz a trama de modo competente. Referências a Christine, o Carro Assassino (1983) e Crash – Estranhos Prazeres (1996) são possíveis de serem encontradas. Contudo, talvez uma comparação mais efetiva seja com a franquia Transformers (2007-2018). O filme de Michael Bay é um exagero heterossexual do amor a carros. Carro Rei (2021) nos apresenta algo bem interessante: os carros são sexualizados. Eles têm relações com humanos. Os carros que vemos no filme possuem todos – ou ao menos sua maioria – vozes masculinas. Tanto os carros como os humanos que levam para frente a ideologia de Carro Rei são e performam o masculino.

Ninho – um protagonista pouco carismático – possui suas próprias ideias, mas elas não estão em consonância com os planos de Carro Rei. Resta ao personagem saber se é tarde demais para impedir um futuro terrível. O roteiro joga muito com o binômio natureza X tecnologia. A formação agrária do protagonista acaba não encaixando com as novas máquinas. A resposta para os problemas pode estar justamente nessa falta de sintonia.

Carro Rei (2021) merece o prêmio que recebeu. Ele surpreende, em primeiro lugar, porque quando nos deparamos com narrativas de transhuumanismo, estamos acostumados a ver mutações corporais, horror corporal e muitos efeitos especiais. O filme de Renata Pinheiro opta por um horror mais político e social. A transformação não precisa ser física para assustar.