Crítica | Censor

(Censor)
Data de Lançamento: 11/06/2021 (EUA)
Diretora: Prano Bailey-Bond
Distribuição: Magnet Releasing

Embora não seja tão simples admitir isso, a construção da atmosfera ideal em um filme de terror parece ser, há tempos, uma das maiores dificuldades enfrentadas pelo gênero. Raramente nos vemos de fato absortos diante de uma história que nos cause medo, tensão e, ao mesmo tempo, interesse pela motivação do protagonista. Felizmente, o britânico Censor, baseado no curta-metragem “Nasty” (2015), também da diretora Prano Bailey-Bond, cumpre com todos os requisitos necessários para nos cativar e fazer de sua existência algo memorável. Oferecendo uma das premissas mais inventivas dos últimos tempos, a obra se desenrola de forma lenta, mas, sem dúvida, compensadora.

O filme se passa durante a era do video nasty (anos 80), onde filmes de terror e exploração de baixo orçamento distribuídos em videocassete foram, além de criticados por seu conteúdo violento pela imprensa e várias organizações religiosas, censurados no Reino Unido. Na trama, uma censora de filmes chamada Enid (Niamh Algar), após assistir a um filme desagradável nota que a história lhe soa estranhamente familiar, como se o diretor conhecesse um episódio muito pessoal de sua vida. É quando Enid passa a ligar os pontos que se vê obcecada em resolver um mistério do passado, o do desaparecimento de sua irmã. Rapidamente a jovem embarca em uma busca pela verdade que dissolve a linha tênue entre ficção e realidade.

Já de início obtemos a certeza de que estamos diante de uma protagonista muito bem desenvolvida, capaz de mover a engrenagem do filme com seus traumas e sua busca pela verdade. A atriz irlandesa Niamh Algar só agrega a essa experiência, trazendo toda a insanidade contida de uma mulher determinada a encontrar sua irmã. O arco de Enid é um dos pontos mais chamativos de Censor. A forma como a personagem precisa sair de sua zona de conforto e adentrar de perto, gradativamente, o mundo sombrio dos filmes de terror violentos, que vai de encontro ao que trabalha, acredita e defende, abre um leque de possibilidades muito bem explorado pela diretora e roteirista Prano Bailey-Bond, estreante na direção de um longa.

Toda a estética do filme propositalmente busca nos inserir diante do contexto do vídeo nasty, no lado complexo, problemático e sombrio dos anos 80. Por meio de uma competente fotografia, que abusa de luzes vermelhas e azuis para criar uma atmosfera misteriosa e fantasiosa, Bailey-Bond nos convida a conhecer um ambiente nebuloso, sujo e repleto de dúvidas. As incertezas da personagem de Enid rapidamente se tornam nossas incertezas, e somos levados por um mar de emoções e pela esperança de que ela consiga provar sua teoria, inclusive para seus pais, que duvidam de sua capacidade de seguir em frente.

Em alguns momentos podemos sentir que a relação entre Enid e sua irmã, quando crianças, deveria ser mais explorada pelo roteiro, o que fortaleceria o drama e a identificação do espectador com a narrativa. Contudo, logo lembramos que, ao mesmo tempo, isso tomaria tempo de tela do horror psicológico e da ousada jornada da protagonista, tão bem desenvolvidos até aqui, dos quais com certeza não queremos abrir mão.

Censor é um filme fácil de dividir opiniões, mas difícil de esquecer, digerir e aceitar, afinal, a obra propõe indagações a respeito de diversas temáticas relacionadas. Há evidentes questionamentos sobre como a indústria cinematográfica permite, até os dias atuais, um visível descuido com o psicológico de diversos contratados, incluindo atores, ou mesmo reflexões acerca da qualificação e da sanidade de tantos funcionários que são designados para realizar uma função de extrema importância para a sociedade. Caminhando entre opostos como: ilusão e realidade; verdades e mentiras; estabilidade e instabilidade, Censor nos provoca sentimentos conflitantes sobre causas e consequências, dissertando, à sua forma, sobre como delicada, distorcida e facilmente influenciável pode ser a mente humana, em um cenário de horror, drama e suspense.