Crítica | Os Segredos do Castelo

Os Segredos do Castelo
(We Have Always Lived In The Castle)
Data de Estreia no Brasil: 18/12/2020
Direção: Stacie Passon
Distribuição: Brainstorm Media

Chegando de mansinho nas plataformas digitais na segunda metade desse mês de dezembro, Os Segredos do Castelo (péssima tradução nacional do título original ‘We Have Always Lived In The Castle‘) baseado no livro “Sempre Vivemos no Castelo” (1962) escrito por Shirley Jackson, responsável também pelo livro que inspirou a série A Maldição da Residência Hill (2018), tem dividido as opiniões a respeito de sua narrativa, ainda que sua qualidade técnica seja inquestionável.

Na história conhecemos a problemática família Blackwood, composta pelas irmãs Constance (Alexandra Daddario) e Merricat (Taissa Farmiga), além de seu tio Julian (Crispin Glover), que após seis anos de uma tragédia familiar, recebe a misteriosa e inesperada visita do ganancioso primo Charles (Sebastian Stan), que passa a morar na casa temporariamente. Conforme os costumes da família entram em conflito com o estilo de vida de Charles, as verdadeiras intenções de cada um começam a surgir enquanto a tensão aumenta a cada dia.

A diretora Stacie Passon, bem vista pela crítica após a boa recepção de seu premiado longa “Antes Sexo do que Nunca” (2013) em festivais, constrói aqui tudo com extrema minúcia e cuidado, da mesma forma como cada objeto enterrado por Merricat parece ter sua importância para a narrativa, assumindo que ao menos somos levados a pensar que seus feitiços funcionam. A ótima trilha musical pausada de Andrew Hewitt auxilia na interpretação cômica do filme, ao mesmo tempo que mantém a tensão entre os personagens. A maneira como a fotografia, o figurino e a cenografia do filme trabalham com o propósito de nos causar estranheza utilizando de cores desarmônicas (realçadas pela ousada colorização), ajuda diretamente a nos preparar para algo muito ruim (clímax) que parece estar sempre prestes a acontecer.

O humor se insere impressionantemente bem entre as cenas tensas. Os personagens junto às suas características intrínsecas, possuem comportamentos caricatos, que vão desde suas expressões corporais, até a forma como emitem seus diálogos. A atriz Taissa Farmiga é quem mais se destaca ao representar uma jovem paranóica, com trejeitos marcantes ao andar e ao encarar outras pessoas. Sebastian Stan também convence com uma interpretação que se altera entre o afetuoso e o desprezível em cerca de segundos.

O roteiro de Mark Kruger consegue aguçar e constranger o espectador com circunstâncias improváveis, em que além de nos deixar a todo segundo à beira de perder a paciência, assim como os moradores da casa, também nos provoca risos contidos com as situações desconfortáveis que nos apresenta. O problema é que no final, todas as “promessas” feitas pelo filme, não são realizadas a troco de algo muito valioso.

É fácil se incomodar com diversas complicações e incoerências do enredo, que permite uma relação contraditória entre os personagens, principalmente entre as irmãs Blackwood. A história não encontra sérios problemas para fluir com facilidade, mas seu ritmo não favorece todo o potencial de suspense existente com a chegada de Charles. É evidente que muito aqui é desperdiçado em prol de uma mera exposição das adversidades enfrentadas por Constance e essencialmente Merricat. O histórico e o objetivo de cada personagem também não são definidos e esclarecidos de maneira satisfatória, e sendo por um propósito narrativo (gerar uma possível surpresa ao final de seu terceiro ato) ou não, o fato é que não colaboram para que nos enxerguemos naqueles personagens e nos envolvamos completamente com a história. Esse visível e provavelmente intencional afastamento do público para com os moradores da casa, afeta o desenvolvimento dramático da obra, ainda que em contrapeso facilite a imersão do público durante as cenas mais risíveis.

Mesmo com todas as complicações de sua trama, Os Segredos do Castelo intriga com seus mistérios e personagens peculiares. Pela sagacidade de propor uma estrutura diferente diante do gênero em que se insere, a obra ainda preserva e discute (mesmo que brevemente) sobre o horror do abuso familiar e a importância do apoio fraternal. Beirando o pretensioso e o dispensável, o filme de Stacie Passon ainda nos ganha pela habilidade em balancear a tensão e o humor em cenas essencialmente dramáticas.