Pinóquio
(Pinocchio)
Data de Estreia no Brasil: 21/01/2021
Direção: Matteo Garrone
Distribuição: Imagem Filmes
Raros são os livros ou contos que foram adaptados para o cinema tantas vezes quanto Pinóquio. Tendo como mais conhecida representação a clássica animação da Disney de 1940, o personagem originalmente italiano já foi reimaginado em diversas décadas ao longo de sua história. Em 2021, é a hora de uma nova e fiel adaptação live action italiana, crua, realista e ao mesmo tempo tocante, ser finalmente tirada do papel e ser exibida para o grande público.
Seguindo a famosa sinopse que todos conhecem (ou ao menos deveriam), quando o solitário marceneiro Gepeto (Roberto Benigni) tenta realizar o desejo de ser pai ao construir um boneco de madeira, ele pede para que o mesmo ganhe vida. Sua súplica é atendida, porém a falta de obediência de Pinóquio (Federico Ielapi) faz com que ele se afaste de casa e trilhe um caminho carregado de mistérios e seres sobrenaturais, que o levará a conhecer e enfrentar os perigos do mundo.
Mesmo não se tratando oficialmente de um filme de terror infanto-juvenil, Pinóquio nos traz, desde seu trailer de divulgação, cenas, personagens e situações repletas de estranheza, e muitas vezes os retrata de forma pesada (leia-se cruel) até demais, aos olhos de infantis almas inocentes. Considerado uma mistura de fantasia e aventura, a obra também consegue nos causar incômodo e até tensão em diversos momentos.
O diretor Matteo Garrone, que desenhou o primeiro storyboard da adaptação com apenas 6 anos de idade, parece conhecer muito bem o terreno onde está pisando, e demonstra maturidade como poucos ao se manter fiel à história principal. Visualmente arrebatador, o design de produção e o figurino brilham em uma fotografia de luzes naturalistas, nos convidando, juntamente às lindas e comoventes melodias de Dario Marianelli, a embarcar na jornada emocionante de um dos personagens mais amados que o cinema já nos trouxe, porém dessa vez retratado de maneira mais autêntica, respeitando suas origens.
Ver o queridíssimo Benigni em um papel como Gepeto (pai/criador de Pinóquio), é algo inexplicavelmente reconfortante. O ator impressiona e até reinventa, à sua forma, a maneira do personagem agir diante de situações diversas. Federico Ielapi, de 9 anos, quem interpreta Pinóquio por meio de uma maquiagem protética, também se mostra bem ao transmitir a teimosia e a inocência do personagem, além de seu desejo de se transformar em um garoto de pele e osso. Famosos personagens da história como o Grilo Falante, o Mangiafuocco, a Fada Azul e muitos outros obviamente também se fazem presente, alguns com mais e outros com menos tempo de tela que o que nos foi apresentado 80 anos atrás na animação norte-americana, que por sua vez já trazia uma outra visão da história original escrita por Carlo Collodi.
É exatamente na exímia fidelidade do texto de Collodi que mora a maior qualidade e também o maior defeito de Pinóquio. Se visualmente nos conquista desde os primeiros minutos até os últimos, e nos apresenta uma história mais sombria do que o convencional, infelizmente muito do roteiro se torna repetitivo e cansativo. O tom moralista exagerado da obra, mantido do livro original, não agrada na maior parte das vezes, e serve para manter crianças (público alvo da obra) na “linha”. O humor da obra funciona e ao mesmo tempo decepciona. A falta de ousadia em de fato “adaptar” alguns elementos narrativos para uma recepção mais próxima dos dias atuais, é o que impede o filme de ser muito maior e mais relevante do que é.
Ainda que com suas sérias limitações, o filme de Garrone é impressionantemente realista, e até comedidamente impiedoso, para que possa transmitir a essência sincera da história italiana. Atrapalhado pela necessidade do roteiro de se mostrar moralmente exemplar na maior parte do tempo, a obra ainda nos arranca lágrimas em suas cenas mais emocionais. Sua direção cautelosa sabe absorver o melhor dos aspectos técnicos e transformá-los em um resultado satisfatório, sonora e visualmente. Pinóquio diverte, mesmo que em sequências específicas, tanto o público juvenil quanto o adulto.
