Resenha HQ | Cesto de Cabeças

Graphic Novel – Cesto de Cabeças
Editora: Panini
Roteiro: Joe Hill
Arte: Leomacs
Tradução: Érico Assis
Ano: 2021

Uma Cesta, cabeças e Joe Hill

Quando uma viagem para visitar seu namorado dá terrivelmente errado, a jovem June Branch tem que usar um machado viking amaldiçoado e uma cesta cheia de cabeças para resolver um mistério e salvar seu namorado. Essa é a premissa da HQ Cesto de Cabeças, lançada pela Editora Panini.

Joe Hill não é estranho ao gênero de terror. Ele é descendente da realeza dos autores de horror. Mas ele não é apenas o filho de Stephen King, ele também é um escritor talentoso, com romances e quadrinhos que já se tornaram filmes (como o Amaldiçoado de 2013 estrelado por Daniel Radcliffe), ou séries de televisão (como Locke & Key e NOS4A2).

  
A história começa com uma cena bem aterrorizante, alguém está caminhando em uma ponte vestido com uma capa de chuva e carregando um machado e um cesto coberto por uma bandeira dos Estados Unidos, do cesto surgem alguns murmúrios, diálogos e um grito.

Imediatamente somos arrebatados para setembro de 1983, mais exatamente para a sonolenta de Brody Island no Maine, cidade fictícia que já serviu como cenário de alguns dos romances e contos de Stephen King e que agora é usada no universo Hill House.

Joe Hill aborda já no início vários pontos que, sem dúvida, desempenharão papéis importantes à medida que a história se desenrola, como por exemplo, uma tempestade iminente e como ela cortará o contato da cidade com o mundo exterior.


Embora seja um início sem muito horror, você fica imediatamente interessado pelo lugar e pelos personagens. Hill faz um trabalho tremendo definindo as personalidades de cada um deles e te dá uma clara ideia de quem eles são e como eles interagem uns com os outros.

O casal June e Liam são apaixonantes, cheios de juventude, parece que são feitos um para o outro, nada menos que adoráveis. Eles compartilham uma boa conversa na viagem em direção ao centro da cidade antes que as coisas comecem a ficar um pouco malucas. O relacionamento deles é leve e divertido e certamente lhe tirará facilmente um sorriso do rosto.

Esse tipo de estabelecimento de personagens já no início é perfeito, pois sabemos que eles serão levados ao limite no decorrer da trama. Como rapidamente nos interessamos por eles e passamos a nos importar com vidas, isso faz com que os acontecimentos terríveis que virão te acertem bem mais em cheio, como se fosse um soco no estômago.


A história se passa em 1983 e definitivamente você sente aquela vibração nostálgica nas páginas, destaque para a moda e cortes de cabelo da época, puro suco dos anos 80. O colorista Dave Stewart dá às páginas uma aparência quase desbotada para coincidir com o período de tempo, como se você estivesse pegando uma fotografia antiga que ficou exposta ao sol por tempo demais e isso é um outro diferencial.

Como a história se passa no fim do verão, há um calor no local que coincide com as artes que mostram o pôr do sol. Isso traz um paralelo muito interessante entre o roteiro e a arte. É como se o sol estivesse se pondo não apenas no dia e na estação, mas na última hora normal na vida dessas pessoas. Daí para a frente, o quadrinho vai ficando cada vez mais escuro a cada virada de página, uma série de acontecimentos que em sequência nos joga em um espetacular cliffhanger que deu aquele arrepio na nuca.


Quatro detentos da prisão de Shawshank, (sim aquela mesmo que você já viu no livro e na adaptação de cinema Um Sonho de Liberdade e que também é mencionada em outras histórias de King), que estavam prestando serviços forçados empreendem fuga o que mobiliza a polícia local. Liam o namorado da protagonista June está terminando seu expediente como policial temporário na escala de verão. Ao se oferecer para auxiliar nas buscas, o xerife Wade Clausen diz para Liam que é melhor ele seguir para a casa do xerife onde poderá ajudar na segurança, já que estão preocupados com esses foragidos soltos pela ilha.

Já na casa do xerife Liam e June são muito bem recebidos e conhecem a residência, inclusive uma coleção de artefatos e artes de origem nórdica que são da coleção particular do xerife. Após algumas conversas o casal participa de um jantar enquanto as buscas continuam na cidade, a esposa do xerife Wade recebe uma ligação telefônica informando que o policial Noel havia sofrido um acidente e que havia falecido, o xerife então pede para que ela vá até a casa do policial para consolar a viúva.

Liam e June ficam sozinhos na casa e tudo caminha para um clima romântico até que os dois ouvem sons vindos da cozinha, certamente alguém havia entrado na casa. Liam pede para que June suba para o segundo andar da casa enquanto vai verificar, ela relutantemente sobe e acaba se escondendo em uma grande caixa na mansão dos Clausen. Após um longo período de silencio June decide sair de seu esconderijo e acaba dando de cara com um dos invasores e sem pensar duas vezes agarra um dos machados da coleção do xerife e foge pela janela.

Perseguida até o lado de fora da casa, ela se esconde até que novamente é descoberta e com um golpe que me pareceu mais sorte do que habilidade, decapitou o invasor. A arte do quadrinho nos mostra como June ficou abalada com o que aconteceu, você pode sentir o horror da cena nos olhos da protagonista, uma jovem que só queria curtir a vida e que agora estava envolvida em uma cena banhada de medo e sangue. E não é só isso, a situação escalona ainda mais quando a cabeça, recém cortada, clama por ajuda já que estava praticamente se afogando no local onde caiu.


A partir daqui se sucedem várias buscas e reviravoltas, June descobre que seu namorado Liam foi sequestrado pelos invasores e que ele poderia ter um segredo que era importante para seus captores, algo que precisaria ser encontrado. Com o auxílio da cabeça que nossa protagonista gentilmente passa a acomodar em uma cesta, ela passa a descobrir o que está acontecendo e para onde os outros invasores levaram Liam. Assim embarcamos em uma saga de descobrimento e resgate que nos levará a conhecer todas as entranhas da sociedade daquela pequena cidade.

Garanto que Hill foi extremamente feliz em misturar de forma incrível realidade e ficção, um suspense policial acelerado, de tirar o fôlego, bem ao estilo dos filmes de Guy Ritchie, mas com plot twists dignos da melhor fase no M. Night Shyamalan. Tenho certeza que você não imagina onde essa mistura de suspense, fantasia nórdica e horror vai te levar.


Um excelente início para o universo de Hill House. Os ganchos de uma edição para outra são incríveis. O leitor fica preso e ansioso para a próxima edição. A tensão é real. A situação, embora obviamente insana, parece fundamentada na realidade.

Cesto de Cabeças é mais uma série autoral de Hill que nos conta uma história de mistério e horror de uma maneira interessante e original. À medida que os leitores juntam os mistérios ao lado de June, eles são convidados a um passeio insano, cheio de reviravoltas e sempre surpreendente e mesmo quando você acha que já entendeu a história, a trama te faz perder a cabeça e te engana novamente.