Crítica | A Casa Sombria

A Casa Sombria
(The Night House)
Data de Lançamento no Brasil: 23/09/2021
Direção: David Bruckner
Distribuição: Searchlight Pictures

Não são muitas as produções comerciais de terror que realmente dão a devida liberdade criativa para que os cineastas apresentem sua verdadeira versão ao público final, daí surgem os famosos “director’s cuts”, liberados posteriormente ao primeiro lançamento nos cinemas e vendidos como uma versão mais completa e/ou genuína do filme. É comum produtores vetarem cortes que ofereçam maior autonomia ao espectador e que o permitam interpretar e enxergar a história à sua maneira, afinal não é o que a maioria das pessoas costuma buscar em um entretenimento nas telonas. Felizmente, A Casa Sombria, o novo filme do promissor cineasta David Bruckner, responsável pelo ótimo O Ritual (2017), foge desse padrão e se coloca contra a correnteza de tramas previsíveis e repetitivas que estamos tão acostumados, nos brindando com o prazer de pensar, sentir e deduzir de diferentes pontos de vista.

Em luto após a morte inesperada de seu marido, Beth (Rebecca Hall) vive sozinha em sua casa à beira do lago. Ainda que tente se manter bem, seus frequentes sonhos e visões perturbadoras não parecem ajudar. Logo, Beth percebe uma possível presença na casa e, indo contra o conselho de seus amigos, começa a vasculhar os pertences do falecido marido, em busca por respostas. Porém, ela não imaginava que dentro de pouco tempo estaria diante de segredos terríveis e sinistros.

Ao mesmo tempo em que o filme muitas vezes se aproxima de um viés mais comercial, utilizado alguns clichês do gênero como jump scares que, pelo menos, funcionam muito bem e realmente nos pegam desprevenidos, a obra também desenvolve o drama da personagem em um ritmo lento, o correlacionando com o horror psicológico vivenciado por Beth e plantando pequenas pistas, sem entregar as respostas que buscamos tão aflitos junto à protagonista. Sobram cenas aterrorizantes que sustentam a tensão do espectador, enquanto os enquadramentos muitas vezes trabalham de forma a ocasional e propositalmente nos desnortear e confundir.

Se Rebecca Hall já tem experiência atuando em thrillers psicológicos e filmes que abraçam o sobrenatural como O Despertar (2011) e O Presente (2015), é justo dizer que a atriz nunca esteve tão bem em uma obra do gênero como neste filme. O diretor David Bruckner soube extrair o melhor da intérprete londrina frente à uma personagem palpável, repleta de traumas, receios e incertezas. É exatamente essa ótima interpretação uma das maiores razões de nos vermos tão presos na trama de A Casa Sombria. Enquanto a ótima trilha musical de Ben Lovett dita o andamento do filme com um caráter onírico e misterioso, a direção de Bruckner valoriza todo e qualquer elemento visual e objeto de cena capaz de nos deixar intrigados com a possibilidade de uma atividade fantasmagórica ou demoníaca.

O roteiro de Ben Collins e Luke Piotrowski dá uma boa margem para que Bruckner explore temas como o luto, a depressão e as inseguranças de Beth. Ainda que o filme não se aprofunde em nenhum desses assuntos, ele permite diversas reflexões através de diferentes perspectivas. É possível, aqui, do começo ao fim, enxergar todos os acontecimentos a partir de um sonho, visão ou alucinação de Beth, que luta para aceitar a partida de seu marido enquanto tenta desvendar seus segredos e conhecer quem de fato foi o homem com quem se casou. Mas a possibilidade sobrenatural também não é descartada em nenhum momento, podendo inclusive coexistir no mesmo espaço-tempo que os frutos da instabilidade emocional da protagonista.

Mesmo sem explorar de maneira satisfatória os personagens coadjuvantes de sua história, A Casa Sombria não nos ganha por nos apresentar uma narrativa fechada e bem esclarecida, mas sim exatamente pelo contrário: nos convidar a refletir sobre as camadas da trama e tirar nossas próprias conclusões a partir do que presenciamos. O novo horror distribuído pela Searchlight Pictures amedronta, assusta, e até nos desorienta positivamente em certos momentos, prometendo manter seu público entretido dos primeiros minutos até os últimos segundos.