Crítica | O Ritual: Presença Maligna

O Ritual: Presença Maligna
(The Banishing)
Data de Lançamento no Brasil: 17/03/2022
Direção: Christopher Smith
Distribuição: PlayArte Pictures

Há quem diga, desde o início do século até os dias atuais, que estamos fartos de histórias de casas assombradas e espíritos vingativos que ameaçam a vida de uma família que acaba de se mudar. Esta é, de fato, uma premissa extremamente explorada pela indústria cinematográfica hollywoodiana, mas é difícil acreditar plenamente em tal afirmação. Não só porque a possível prova do contrário seria que muitos de nós, amantes do horror sobrenatural, ainda continuamos consumindo desenfreadamente novos longas e séries deste subgênero, mas também devido ao seu potencial de inovação. Algumas obras, embora compartilhando do mesmo ponto de partida, ainda conseguem inovar, mesmo que minimamente, ao trazer no meio do caminho uma elaboração diferenciada de personagens, circunstâncias imprevisíveis ou mesmo mensagens poderosas e de alguma forma relevantes para o seu público.

Perto de completarmos 10 anos desde que o divisor de águas, Invocação do Mal (2013), de James Wan, revolucionou a forma como encaramos filmes de assombrações, torna-se cada vez mais difícil notarmos algum lançamento assumidamente comercial sobre casa(s) mal-assombrada(s) capaz de realmente nos entreter e amedrontar, ainda que apenas por alguns segundos. Talvez a última obra a cumprir este feito tenha sido a série A Maldição da Residência Hill (2018), criada por Mike Flanagan, que definitivamente soube contar uma tocante e aterrorizante história com um belíssimo roteiro aliado à uma técnica impecável. Entretanto, ainda presenciamos, ano após ano, infelizes inúmeros lançamentos de obras que não se preocupam em apresentar qualquer resquício de singularidade para o gênero, se apropriando de fórmulas prontas e almejando o mais passageiro, raso e instantâneo entretenimento de seus espectadores. Por mais triste que seja admitir, o novo longa dirigido por Christopher Smith (responsável pelo ótimo Triângulo do Medo, 2009) percorre exatamente essas estradas tortuosas.

O Ritual: Presença Maligna se baseia na história real envolvendo a família dos Smiths (sim, o mesmo sobrenome do diretor, rs), que residiram na famosa e macabra reitoria Borley (considerada por muitos como a casa/mansão mais assombrada do Reino Unido) durante o início dos anos 30, na Inglaterra. Acompanhamos a família composta por um reverendo chamado Linus (John Reffernan), sua esposa Marianne (Jessica Brown Findlay) e sua filha Adelaide (Anya McKenna Bruce), que se mudam para uma mansão misteriosa. Aos poucos, eles começam a presenciar eventos bizarros. Agora, eles precisam descobrir o segredo terrível que mantém o mal dentro de seu lar.

Sem precisar de mais de 30 minutos de filme, logo notamos que seus problemas vão muito além da simples (porém já comprometedora) falta de originalidade do roteiro, tornando-se ainda mais questionável devido à forma embaraçosa com que a narrativa entrelaça seus eventos. Buscando ou não trazer reflexões ou forçar o espectador a “ligar os pontos” (se é que eles sequer existem aqui), a verdade é que o novo longa de Smith simplesmente não se coloca de maneira convidativa perante seu público e nem  mesmo apresenta devidamente os receios, anseios e angústias de seus personagens, o que desde cedo constrói uma sólida barreira entre o envolvimento do espectador e o objetivo da trama.

Apesar de uma boa entrega de atores como Jessica Brown Findlay e Sean Harris (que aqui interpreta um ocultista chave para a trama), e também de uma execução interessante de algumas circunstâncias bizarras e desconfortáveis, O Ritual: Presença Maligna se mostra confuso em praticamente todas as suas intenções. A necessidade do enredo de transformar o passado e os traumas da protagonista (Marianne) em algum motivador maior por meio de cenas extensas e repetitivas, simplesmente faz com que a força dos elementos sobrenaturais caiam por terra, uma vez que o roteiro encontra sérias dificuldades em conciliar ambas as tarefas. 

Em meio à essa miscelânia de finalidades inférteis e oportunidades desperdiçadas, ainda sobra tempo de tela (e coragem) para que o longa se dedique a esboçar um vago e inexplorado argumento sobre o sexismo e o autoritarismo de certas atitudes do vigário para com sua esposa, sua enteada, e sua governanta. Argumentos estes que simplesmente não somam e não correspondem à expectativa gerada. Isso tudo sem falar dos diálogos excessivos, expositivos e até filosóficos sobre propósitos, sentimento de culpa, arrependimento e a consequência dos mesmos. Os diálogos, assim como os breves argumentos plantados aleatoriamente ao longo do filme, claramente não se justificam e só tornam nossa experiência ainda mais maçante.

Conforme a importância da trama (baseada em fatos reais) se perde nas mãos de um texto fraco e inseguro, não nos resta dúvidas de que a verdadeira razão por trás da produção foi a de causar pequenos picos de tensão no público e tentar entreter o mesmo com o máximo de informações narrativas possível, ainda que as mesmas não se conectem de nenhuma forma. Sabendo que o cinema britânico de horror já teve melhores momentos, concluímos que O Ritual: Presença Maligna ao menos serve para nos apresentar o talento da atriz mirim Anya McKenna Bruce e nos relembrar (se é que precisávamos) de que longas de casas mal-assombradas ainda podem ser divertidos, mas que a maior probabilidade é de serem meramente frustrantes, principalmente se não se colocarem a disposição de inovar, mesmo que minimamente.